quinta-feira, 30 de junho de 2011


soneto


os minutos de espera na estação
endossam o prelúdio do retorno.
a noite com seus passos de coturno
avança e vem, imita os sons que são

da rua. um velho que ao meu lado ronca,
ri e me afasta um tanto dos barulhos
que me embalam, num vem e vai de onda
distante, que agora é nada. espúrio

e arbitrário é o coração dos homens,
eu sentencio. espúrio e arbitrário!
o funcionário a recolher bilhetes

desperta outra vez meu olhar pra ontem.
- pobre rima vestida de passado!
eu subo as escadas e pago o frete.






cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 27 de junho de 2011


o nomeador


o moço sem a perna
tropeça no degrau das cores
e cobre de ausência o arco-íris.

feliz, ri de si
e do membro que lhe falta.

um novo adão
garante mais que a
(sagrada) costela
ao mundo
coxo
que lhe nega o salto.

torto,
vê a graça nos que
se endireitam nas cadeiras.





cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 23 de junho de 2011

seu valente

nos braços de meu avô paterno
o mundo se esparrama em peixes
invisíveis de infância.

quantas vezes pescamos juntos
na memória!

nós naquele barco...
e os extremos da vida se ajeitando.

na luz que vinha do ocaso,
já não se sabia a hora do dia.
meu avô à proa rindo baixo,
o outro lado de mim.




cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 20 de junho de 2011


da verdadeira companhia


a pedra que levo ao peito
pesa feito pena.

- essa ilógica relação de sentido
se baseia em som
e dispensa entendimento.

pois eu sou a folha que dança no vento,
e conto apenas com meu próprio peso.






cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 16 de junho de 2011


do eterno pessimismo


não me abalo,
se o mundo não se acaba,
- é sábado! -
eu me acabo.









cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 13 de junho de 2011


introspectivo


silêncio:
que a alma pede a palavra surda
e a voz não sabe mais que o gesto.

eu sinto a ausência dessa hora,
e gosto.
o espaço entre os espasmos me agrada
mais que a eternidade...

o que sou
nesse incômodo
que não quero?

não sei...
mas penso que o som inaudito é música.
é incenso.
é ouro e mirra.




cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 9 de junho de 2011


não


é duro ter que se convencer todos os dias
de que se crê naquilo que a gente mais duvida.

***

eu tenho pressa em resolver este poema
pressa em vomitar essa vertigem
que é o medo de dizer e é por isso que eu digo 
qualquer coisa mesmo não importa.

que são versos no universo da mentira?

***

os pobres dormem sob o frio de junho 
e me enriquecem a palavra.



cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 6 de junho de 2011


náufrago


o mar vadiando por entre as pedras
do emissário
sou eu

a revelar corruptos
e desdenhar da areia plana.

por sete vezes me entreguei
aos teus canais,

grilhões que me aprisionam à costa.



cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 2 de junho de 2011


reminiscência

lembro de ver os olhos de luiza
e de lembrar de vaga-lumes.

(os olhos de luiza
sinalizavam na noite
aquilo que a noite escondia!)

lembro de como eram bonitos piscando
e de como a vida piscava
nos olhos que luziam.

não tinha corpo,
nem cara.

cara de fernando diegues
palavra de victor valente