segunda-feira, 30 de abril de 2012

ensinamento

me encosta leve à tua janela
e entorta o corpo no meu ombro.

viaja as horas que a vida nega.

que a vida é má, meu bem, é a vida.
a vida é má pra quem não sabe o que fazer com ela.




cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 26 de abril de 2012

claritude

olhar para mim
até perder de vista
a mira.

olhar
até que os olhos se desfaçam na espuma
das lembranças.

um olhar além da luz e do desejo.
além, talvez, do céu, escondido atrás do azul,

apesar de tudo, belo.




cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 23 de abril de 2012


ou quem ou quando


tanto que se perde nos abraços que não damos...

aquele cheiro de roupa nova,
de alma velha conhecida.

um verso derramado no ouvido,
uma chance que não volta.

tanto que se perde nos abraços que negamos!

mais dois amigos vão-se embora
e quem sabe quando voltam? talvez quase.

a conta da saudade engorda a mágoa do que fomos,
seres cheios de ausência, rangendo os dentes pela noite fria.




cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 19 de abril de 2012

fotografia

sons que vêm de dentro...
saudades da véspera, de nós
e de mim.

lágrimas do corpo e praia,
risco entre a areia e a espuma.

brilho do mar
das garrafas em que me afogo.





cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 16 de abril de 2012

poema para embalar fernanda

menina dos olhos de fada,
onde guardas a madrugada?

que os meus olhos me imploram a luz da lua
como os bichos que se abrigam na manada.

dá-me os olhos teus de sombra
e leva embora o ocaso desta insônia
que me corta, feito seda sob o fio da navalha.

o breu noturno dos teus olhos de criança,
que a infância é boa, mas o fim é breve
e nunca tarda.






cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 12 de abril de 2012


03:03

rugas na pele da aurora.
a manhã se demora
e chega velha.

a moça vestida de noiva enleva a noite,
se entrega ao sono,
mas desperta.






cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 9 de abril de 2012

vado e teodoro

dona flor era mulher de um só marido.
vivo, conhecia um homem só.

mas a vida é mistério
e entre o céu e a terra há mais que meros suicídios
de ingleses tristes, vestidos de dinamarqueses.

mostra que o amor é rosa e desabrocha em seu próprio ritmo:
mulher, sem nunca ter traído, sabe ser fiel a dois.






cara de fernando diegues
palavra de victor valente

quinta-feira, 5 de abril de 2012



giz

velhas eram todas as horas,
os dias perdidos sem trégua.

velhos, os homens,
os segredos todos idosos,
melindrados de medo.

as roupas de cama,
os enxovais,
as moças, todas,
velhas por casar mais cedo.

velhas nas escadas,
brincando de bonecas,
fingindo a idade que não têm.

só a palavra mal dita
por entre os dentes
podres da miséria
redimia. 

ou quase.

triste a dor de quem nasce
no fim da vida.

no país dos iletrados
palavras não bastam.

são ideias como as outras,
velhas demais para acontecer.



cara de fernando diegues
palavra de victor valente

segunda-feira, 2 de abril de 2012

oremos

ai essa mulher
do nome de pedra e olhar molhado!

- são marolas da praia os olhos dela.
são cacos de vidro luzindo na água.

eu sinto a calma que contorna as coxas dela,
e gosto.
e gosto mais quando sinto mais de perto.

(bendito seja Deus por inventar o amor,
e num dia de humor ter feito o sexo.)



cara de fernando diegues
palavra de victor valente